Num fim de tarde de inverno que já é noite, o eléctrico sobe devagar a rua, sob a chuva que cai do céu da cidade. Neste momento, em que mais nada no mundo acontece a não ser o avançar lento e barulhento da carruagem antiga de madeira, o eléctrico parece de brincar. A rua, os prédios, os passeios que reflectem as luzes amarelas dos candeeiros e dos faróis riscados pela chuva, lembram uma enorme maquete molhada. E o brinquedo avança, soluçante, ao som do motor em esforço e do chiar dos carris.
O eléctrico transporta-te para a infância. Lentamente, vem-te à memória um livro antigo, onde leste a história de um soldadinho de chumbo. A lembrança do cheiro e do toque das páginas evoca uma imagem de chamas, onde ardem, num abraço, o soldado e a sua bailarina.
De repente, o observador sente-se observado. E, vinda do céu da cidade, vê aproximar-se a mão gigante de uma criança…