A Cidade e a Memória

Sobes a rua, com pressa de deixar para trás o barulho da multidão que faz fila à porta dos lugares famosos da cidade.

Sobes a rua e ouves aproximar-se o som familiar do torno de madeira a rodar. Passas pela porta que mostra o torneiro a trabalhar sob a luz fraca de uma lâmpada e sentes o cheiro da serradura que reveste completamente o chão.

Sobes outra rua. Passas pela serração; reparas de novo nas tábuas muito largas do soalho rude e gasto, nos veios da madeira iluminados pela luz ténue que sempre banhou aquele espaço.

Noutra rua ainda, olhas enfeitiçada o dourado velho dos varões de metal, geometricamente organizados por espessuras em prateleiras quadradas, a brilhar na escuridão do fundo da loja.

Sobes a rua, em direcção à praça onde antes dizias que para ti terminava a cidade. Mais devagar, agora, como que despedindo-te de cada um destes lugares. A nostalgia invade-te e tentas memorizar os sons, as imagens e os cheiros que sabes que amanhã podem já não estar cá.

Sobes a rua e sabes que é hora de descobrir outras cidades, dentro da tua cidade.

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